21 de outubro de 2018

Poder Pastoral e Fascismos: Fake News e o Governo de Algoritmos e Milícias

Todo fascista tem quatro elementos principais:

1. O culto da violência, seja ela física ou simbólica.

2. Culto paranoico e exacerbado da nacionalidade e a insensibilidade absoluta com as classes mais vulneráveis que são objetos de violência social reiterada, por exemplo, os grupos que compõem as minorias, os pobres e os imigrantes.

3. Culto à liderança como transferência de decisão e força a partir de uma crença sobre a qual a concentração do poder na mão de um, ou seja, "aquele que vai colocar a mão e mudar tudo" como a renúncia de si para uma instância superior da unidade soberana.

4. A escolha motivada pela frustração ao qual alimenta um desejo de ordem, disciplina e alinhamento social através da vontade de aniquilamento e eliminação.

No Brasil nota-se que essa frustração se traduz nessa busca por parte da população de uma mão forte refletida em um governo militarizado e o desejo de ruptura radical com “tudo que está aí” sem se atentar com o retorno de toda uma tradição autoritária brasileira.

O ex-capitão do Exército com seu discurso punitivista, religioso, conservador, reacionário, objetivo e simplificado conseguiu capturar as insatisfações e os ativismos de “jovens” que se autodeclaravam apartidários em 2013.

No atual contexto brasileiro das eleições se tornou comum ser utilizado como objeto de campanha o gestual de uma arma apontada com as mãos e o comportamento de grande parte daqueles que fazem declarações que louvam e naturalizam a tortura e celebram outras práticas violentas.

Percebemos claramente que é um modelo de campanha que está em blindagem e distanciamento do debate público e alimentada pela produção de Fake News no campo virtual e o uso estratégico das redes sociais, se valendo apenas de vídeos, imagens, mensagens e edições totalmente deturpadoras na gestão dos rumores que circulam nas redes como o Facebook e o WhatsApp produzindo o uso contínuo da mentira como instrumento de mobilização.

Podemos ressaltar os altos investimentos que essa indústria de circulação de notícias falsas tem pelas empresas privadas, exemplos como as metodologias da Cambridge Analytica investindo paulatinamente nessas políticas e campanhas de fomentação de boatos. Seria como um governo de algoritmos que faz emergir os fascismos no interior dos dispositivos democráticos de comunicação.

Seria a democracia o campo possível para o governo de condutas através de algoritmos? E em que medida os próprios dispositivos democráticos de comunicação permitiram nos espaços virtuais e nas ruas as formas mais desavergonhadas de fascismos que estamos vendo hoje?

Em meio a essa indústria de Fake News e captura de condutas pelo governo de algoritmos, percebe-se a problemática do poder pastoral. O pastorado nessas práticas de governo de condutas na qual a renúncia se tornou um projeto de “renovação da política”.

O poder pastoral nas condutas fascistas se faz presente nessa renúncia de si e transferência de decisão e poder na mão de um líder, como aquele que “vai colocar a mão e resolver tudo”, assim como vem acontecendo no Brasil com a crença messiânica de um militar no poder de Estado como sinônimo de mudança.

A forma como o capitão reformado e candidato se expressa, demonstra o modo sobre o qual o poder pastoral se integra na convocação positiva e subjetiva dessa pragmática do rebanho, sempre com um discurso chantagista emocional que apela para o lado pessoal.

Falas do tipo: “Se alguém invadisse sua casa? Você deixaria? ”, para justificar uma prática de criminalização dos movimentos sociais e indígenas. “Se fosse alguém da sua família?”, como um discurso de defesa dos patrimônios e da propriedade privada baseada no armamento da população.

A partir disso, mostra-se uma forma de governo que se configura na produção de milícias em consentimento com o governo federal que libera as parcelas fascistas estabelecerem a abertura de caça aos comunistas imaginários, feministas e “correção de homossexuais”.

Contudo, vemos a autorização da intolerância por parte dos setores fascistas, o modo como fazem uso de inversão de valores e a imputação de culpa aos que são vítimas de atos de violências constantes.

É importante salientar que os ataques contra minorias, adeptos da campanha #elenão, jornalistas e eleitores dos partidos dito de esquerda, como também as ameaças virtuais não são apenas uma questão de partido ou efeito de um golpe, essas práticas fascistas estão disseminadas na sociedade e entranhadas nos corpos e afetos daqueles que fazem proliferar a “solução final” como a sua afirmação do direito de matar quem não pensar e agir igual a eles.

Mesmo que apareça alguém defendendo o seu líder ao dizer que Bolsonaro não tem controle às ações de seus apoiadores, e que por isso não pode ser responsabilizado, é em nome dele que tais práticas estão sendo executadas em vários lugares. Ele no mínimo deveria se retratar publicamente contra essas práticas, algo que ele não faz. A mesma retratação pública de solidariedade que os demais candidatos fizeram quando ele mesmo tomou uma facada. Muito pelo contrário, o que se vê é o ex-capitão do Exército se fazer de vítima em não assumir suas responsabilidades. E cabe lembrar que Bolsonaro foi o único candidato que não se solidarizou até mesmo quando ocorreu o atentado político seguido de assassinato de Marielle Franco. Nem ele e nem seus seguidores, antes mais utilizaram das redes sociais para fazerem a difamação de seus opositores.

Enquanto resultado disso, vemos se fomentar cada vez mais as práticas de governo de condutas do cidadão polícia como a produção de milicianos em concordância com a defesa da sociedade, da propriedade e a razão de Estado através desses regimes de obediência. Nota-se a moralização da democracia enquanto a implantação do terrorismo de Estado a partir da força de lei.

O cidadão polícia é aquele que participa das redes de denúncias produzidas pelo Estado e mercado enquanto um colaboracionista direto no exercício de poder. Ele é o efeito arrebanhado e enfurecido do poder pastoral. Numa ditadura que se disfarçou de redemocratização ao qual conseguiu construir as suas bases sociais e consensos, é possível pensar que com esse apoio advindo de grande parte da própria sociedade, serão produzidos os dispositivos do governo de exceção no Brasil, e ainda irão falar que tudo isso estará dentro do jogo democrático.

É urgente a preocupação com o presente e o diagnóstico crítico e contundente diante do mundo e sociedade em que vivemos. E justamente esse questionamento do agora é que perturba, que nos mostra a urgência de se criar as potências e resistências agonísticas. Hoje vemos que as práticas fascistas são acolhidas nos sistemas partidários, nas leis, no recrudescimento do âmbito institucional, nos programas de saúde e educação, como também nas redes que possibilitam as suas repercussões para uma política maior. É saber que não se conversa com fascistas, o bate-boca é o campo privilegiado deles para irromper as forças físicas através das condições de cidadão polícia ressentido.

É hora de se inventar agonismos que rejeitam as redes dos colaboracionismos do cidadão polícia associado com o capital humano e empreendedor, como também sair da condição de vítima que sempre visa a recomposição dos governos de Estado e do mercado como o resgate e reforço de instituições democráticas. Produzir as práticas livres e difusas de invenções de liberdades é muito mais do que apenas um esforço sustentável de melhorias, e sim como a capacidade cotidiana de resistir ao resiliente e ao repressivo como táticas dispersas de rompimento e obstrução logística das relações de poder entre Estado e sociedade.

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