Todo fascista tem quatro
elementos principais:
1. O culto da violência, seja ela física ou
simbólica.
2. Culto paranoico e exacerbado da
nacionalidade e a insensibilidade absoluta com as classes mais vulneráveis que
são objetos de violência social reiterada, por exemplo, os grupos que compõem
as minorias, os pobres e os imigrantes.
3. Culto à liderança como transferência de decisão
e força a partir de uma crença sobre a qual a concentração do poder na mão de
um, ou seja, "aquele que vai colocar
a mão e mudar tudo" como a renúncia de si para uma instância superior
da unidade soberana.
4. A escolha motivada pela frustração ao qual
alimenta um desejo de ordem, disciplina e alinhamento social através da vontade
de aniquilamento e eliminação.
No Brasil nota-se que
essa frustração se traduz nessa busca por parte da população de uma mão forte
refletida em um governo militarizado e o desejo de ruptura radical com “tudo que está aí” sem se atentar com o
retorno de toda uma tradição autoritária brasileira.
O ex-capitão do Exército
com seu discurso punitivista, religioso, conservador, reacionário, objetivo e
simplificado conseguiu capturar as insatisfações e os ativismos de “jovens” que
se autodeclaravam apartidários em 2013.
No atual contexto
brasileiro das eleições se tornou comum ser utilizado como objeto de campanha o
gestual de uma arma apontada com as mãos e o comportamento de grande parte
daqueles que fazem declarações que louvam e naturalizam a tortura e celebram
outras práticas violentas.
Percebemos claramente que
é um modelo de campanha que está em blindagem e distanciamento do debate público
e alimentada pela produção de Fake News
no campo virtual e o uso estratégico das redes sociais, se valendo apenas de
vídeos, imagens, mensagens e edições totalmente deturpadoras na gestão dos
rumores que circulam nas redes como o Facebook e o WhatsApp produzindo o uso
contínuo da mentira como instrumento de mobilização.
Podemos ressaltar os
altos investimentos que essa indústria de circulação de notícias falsas tem
pelas empresas privadas, exemplos como as metodologias da Cambridge Analytica investindo paulatinamente nessas políticas e
campanhas de fomentação de boatos. Seria como um governo de algoritmos que faz
emergir os fascismos no interior dos dispositivos democráticos de comunicação.
Seria a democracia o
campo possível para o governo de condutas através de algoritmos? E em que
medida os próprios dispositivos democráticos de comunicação permitiram nos
espaços virtuais e nas ruas as formas mais desavergonhadas de fascismos que
estamos vendo hoje?
Em meio a essa indústria
de Fake News e captura de condutas pelo governo de algoritmos, percebe-se a problemática do poder pastoral. O
pastorado nessas práticas de governo de condutas na qual a renúncia se tornou
um projeto de “renovação da política”.
O poder pastoral nas
condutas fascistas se faz presente nessa renúncia de si e transferência de
decisão e poder na mão de um líder, como aquele que “vai colocar a mão e resolver tudo”, assim como vem acontecendo no
Brasil com a crença messiânica de um militar no poder de Estado como sinônimo
de mudança.
A forma como o capitão
reformado e candidato se expressa, demonstra o modo sobre o qual o poder
pastoral se integra na convocação positiva e subjetiva dessa pragmática do
rebanho, sempre com um discurso chantagista emocional que apela para o lado pessoal.
Falas do tipo: “Se alguém
invadisse sua casa? Você deixaria? ”, para justificar uma prática de
criminalização dos movimentos sociais e indígenas. “Se fosse alguém da sua
família?”, como um discurso de defesa dos patrimônios e da propriedade privada
baseada no armamento da população.
A partir disso, mostra-se
uma forma de governo que se configura na produção de milícias em consentimento
com o governo federal que libera as parcelas fascistas estabelecerem a abertura
de caça aos comunistas imaginários, feministas e “correção de homossexuais”.
Contudo, vemos a
autorização da intolerância por parte dos setores fascistas, o modo como fazem
uso de inversão de valores e a imputação de culpa aos que são vítimas de atos
de violências constantes.
É importante salientar
que os ataques contra minorias, adeptos da campanha #elenão, jornalistas e eleitores dos partidos dito de esquerda,
como também as ameaças virtuais não são apenas uma questão de partido ou efeito
de um golpe, essas práticas fascistas estão disseminadas na sociedade e
entranhadas nos corpos e afetos daqueles que fazem proliferar a “solução final”
como a sua afirmação do direito de matar quem não pensar e agir igual a eles.
Mesmo que apareça alguém
defendendo o seu líder ao dizer que Bolsonaro não tem controle às ações de seus
apoiadores, e que por isso não pode ser responsabilizado, é em nome
dele que tais práticas estão sendo executadas em vários lugares. Ele no mínimo
deveria se retratar publicamente contra essas práticas, algo que ele não faz. A
mesma retratação pública de solidariedade que os demais candidatos fizeram
quando ele mesmo tomou uma facada. Muito pelo contrário, o que se vê é o
ex-capitão do Exército se fazer de vítima em não assumir suas
responsabilidades. E cabe lembrar que Bolsonaro foi o único candidato que não
se solidarizou até mesmo quando ocorreu o atentado político seguido de
assassinato de Marielle Franco. Nem ele e nem seus seguidores, antes mais
utilizaram das redes sociais para fazerem a difamação de seus opositores.
Enquanto resultado disso,
vemos se fomentar cada vez mais as práticas de governo de condutas do cidadão
polícia como a produção de milicianos em concordância com a defesa da
sociedade, da propriedade e a razão de Estado através desses regimes de
obediência. Nota-se a moralização da democracia enquanto a implantação do
terrorismo de Estado a partir da força de lei.
O cidadão polícia é
aquele que participa das redes de denúncias produzidas pelo Estado e mercado
enquanto um colaboracionista direto no exercício de poder. Ele é o efeito
arrebanhado e enfurecido do poder pastoral. Numa ditadura que se disfarçou de
redemocratização ao qual conseguiu construir as suas bases sociais e consensos,
é possível pensar que com esse apoio advindo de grande parte da própria
sociedade, serão produzidos os dispositivos do governo de exceção no Brasil, e
ainda irão falar que tudo isso estará dentro do jogo democrático.
É urgente a preocupação
com o presente e o diagnóstico crítico e contundente diante do mundo e sociedade
em que vivemos. E justamente esse questionamento do agora é que perturba, que
nos mostra a urgência de se criar as potências e resistências agonísticas. Hoje
vemos que as práticas fascistas são acolhidas nos sistemas partidários, nas
leis, no recrudescimento do âmbito institucional, nos programas de saúde e
educação, como também nas redes que possibilitam as suas repercussões para uma
política maior. É saber que não se conversa com fascistas, o bate-boca é o
campo privilegiado deles para irromper as forças físicas através das condições
de cidadão polícia ressentido.
É hora de se inventar agonismos que rejeitam as redes dos
colaboracionismos do cidadão polícia associado com o capital humano e
empreendedor, como também sair da condição de vítima que sempre visa a
recomposição dos governos de Estado e do mercado como o resgate e reforço de
instituições democráticas. Produzir as práticas livres e difusas de invenções
de liberdades é muito mais do que apenas um esforço sustentável de melhorias, e
sim como a capacidade cotidiana de resistir ao resiliente e ao repressivo como
táticas dispersas de rompimento e obstrução logística das relações de poder
entre Estado e sociedade.